Capoeira Angola: Possíveis origens

Introdução
Após mais de quatrocentos anos de perseguição e proibições, o jogo da capoeira angola chega aos nossos dias, com um conteúdo artístico, filosófico, cultural e social, que o tornam uma das mais importantes manifestações de nosso povo, sendo conhecido e praticado em todo o mundo.

Capoeira Angola
É uma arte que integra corpo, mente e espírito, a sua prática é realizada em grupo e está presente numa roda de capoeira angola um conjunto de expressões que incluem luta, dança, ancestralidade, música, teatro, filosofia, espiritualidade, brincadeira e jogo.
A capoeira angola preserva uma série de valores tradicionais africanos, que orientam o comportamento das pessoas participantes, tanto individuais como coletivamente, fortificando a identidade e a responsabilidade de cada um com o papel de resistência, libertação e transformação social que fazem parte dos princípios formadores desta arte.

Origens da Capoeira Angola
O tráfico de escravos através do Atlântico foi um dos grandes empreendimentos comerciais e culturais que marcaram a formação do mundo moderno e a criação de um sistema econômico mundial (início da globalização). A participação brasileira nesta trágica aventura é estimada em 40% dos 15 milhões ou mais de homens e mulheres arrancados de suas terras.
Pouco pode se afirmar à cerca da origem da capoeira, devido à falta de documentação. Porém, tudo começa na mãe África, continente originário dos primeiros homens que se espalharam pelo mundo, gerando todos os povos. Através da tradição oral e de raros registros, sabe-se que foram os africanos escravizados, aqui no Brasil, que desenvolveram essa arte e algumas versões são normalmente bastante aceitas no meio capoeirístico.


Acredita-se “ser a Capoeira de origem africana, mais precisamente da Ilha de Lubango, na aldeia dos MUCOPES, localizada no sul de Angola. (...) Na época do acasalamento das zebras, os machos, a fim de ganharem a atenção das fêmeas, travavam violento combate. Daí os jovens guerreiros mucopes passarem a imitar alguns passos desse ritual, que denominaram de N’GOLO”.

Os habitantes dessa aldeia realizavam uma vez por ano uma grande festa com o nome de EFUNDULA, ocasião em que as meninas que já tinham atingido a puberdade e, estando assim prontas para o casamento, teriam como marido aquele guerreiro que tivesse a melhor performance na prática do N’GOLO”.

Já na ilha do Cabo existia um ritual, conhecido como “BASSULA”, “(...) onde um derruba o outro através de agarramento, balões, pegar as pernas para derrubar, pescoço, cintura, o objetivo é derrubar o adversário, talvez os golpes de derrubar, de desequilibrar na Capoeira, tenham vindo da Bassula, tem também a ‘kabangula’, que é uma luta de mão, que é um tipo de boxe com as mãos abertas. (...) Tem também o ‘Umundinhu’, que é um ritual, um jogo, que usa as mãos e os pés, e tem também as danças acrobáticas”.

Possivelmente a Capoeira seja a mistura destas culturas, danças guerreirase rituais africanos, adaptadas como luta de libertação ao sistema de escravidão que estavam enfrentando no Brasil.
Já estudos referentes a procedência do nome Capoeira, podem ter duas origens:

Origem rural
A palavra Capoeira é um termo tupi-guarani que dentre tantos significados, quer dizer mato que cresce em cima da vegetação que foi cortada.
Independente disso acredita-se que era nesse tipo de vegetação que o escravizado, burlando a vigilância do feitor, fugia para reviver os folguedos de sua terra natal e dessa forma tentar atenuar o sofrimento da escravidão (prática essa, que por razões obvias era extremamente reprovada e que invariavelmente terminaria em castigo no tronco).

Origem urbana
A palavra capoeira, também pode significar cestos de vime, que na época eram muito utilizados pelos escravizados, no cais do porto, para carregar aves galináceas (capões).Esses carregadores, também chamados de capoeiras, nos seus raros momentos de folga, largavam os seus cestos e se reuniam para, ao som de palmas e cânticos, reviver os folguedos de sua terra natal, assemelhando-se assim à versão anterior.


CARACTERISTICAS DE UM JOGO DE CAPOEIRA ANGOLA

MALÍCIA: Todos os verdadeiros mestres concordam em admitir que este é um importante fundamento da capoeira. ou seja. a habilidade e surpreender o adversário, de “fechar-se” e evitar ser apanhado de surpresa pelo outro. O bom capoeirista está sempre “fechado”. O angoleiro distrai seu rival, brinca com ele, engana-o, mostrando-se desprotegido, para ser atacado justamente onde deseja e, assim, lançar seu contra-ataque com mais eficácia.

COMPLEMENTAÇÃO: Os dois jogadores ficam atentos aos movimentos um do outro e sempre se deslocam, atacam. ou se defendem em função do que fizer o adversário, ou para provocar determinado movimento deste. Joga-se sempre perto do rival e respondendo a seus movimentos através de ataques. defesas e contra-ataques. Os capoeiristas não devem entrar em choque direto. porque assim a harmonia do jogo será rompida. É preciso contribuir para criar essa harmonia desenvolvendo o próprio jogo, mas deixando que o adversário possa fazer o seu próprio. E preciso jogar e deixa jogar.

JOGO BAIXO: O jogo de Angola tem movimentos predominantemente (mas não apenas) baixos, isto significa que, embora grande parte dos movimentos requeira que ambas as mãos estejam apoiadas no chão, as pernadas são em geral, de pouca altura, e as posições de guarda (com as quais se espera o movimento do rival e se prepara o próprio) exigem que as pernas estejam flexionadas e o tronco e a cintura a baixa altura. Ao contrario do estereótipo, Angola também se joga em pé, mas as pernadas são baixas.

AUSÊNCIA DE VIOLÊNCIA: Na capoeira angola, os jogos. em geral são exatamente isso - Jogos. Pretende-se atingir o adversário com alguns golpes, evitar que ele nos alcance, mas na angola bem feita, jogada por verdadeiros angoleiros, a luta (no sentido de atingir o adversário) está sempre inseparavelmente misturada com o jogo.

MOVIMENTOS BONITOS: Este é um dos elementos mais importantes na Capoeira Angola e dos menos entendidos. Nesta mistura de luta e jogo, o elemento estético adquire grande importância. Mas é uma estética própria, que surge do contexto étnico afro-brasileiro). Essa característica se soma as anteriores, e, embora o angoleiro procure fazer movimentos bonitos, é difícil ver um jogador ficar desprotegido por fazer um movimento belo ou interromper a harmonia do jogo para fazer uma pirueta.

MÚSICA LENTA: A Capoeira Angola é cadenciada e se realiza com ritmo lento em comparação com o de outras variantes. E um jogo de domínio do corpo. mas também de mente. Num bom aprendizado os movimentos de um jogo são esmiuçados e as várias possibilidades de ação estudadas, como num jogo de xadrez. A descontração do corpo e os movimentos lentos permitem que os jogos de angola sejam muito mais demorados.

IMPORTÂNCIA DO RITUAL: A capoeira é um jogo com regras não escritas mas que, assim mesmo, estão presentes e regem seu desenrolar. No caso da Angola, o conhecimento dessas regras é muito importante. Não se pode ser um bom angoleiro quando não se sabe direito quando sair do pé do berimbau, que gestos invocando proteção se realizam antes disso ou como se faz adequadamente uma “chamada”.

TEATRALIDADE: Esse é outro aspecto geralmente relegado quando se fala de capoeira. Na prática, cada vez mais é deixado de lado como coisa do passado. No entanto, as expressões no rosto, os movimentos das mãos, fingindo medo, distração, alegria, convidando o adversário a jogar ou distraindo sua atenção; a maneira como certas canções são gestualizadas; tudo isso faz parte da essência da capoeira Angola.

Este texto faz parte de um estudo desenvolvido pelo argentino Alejandro Frigério, intitulado: Capoeira, de arte negra a esporte branco.